***Dentro de mim, métodos antigos para "ensinar a lição" ***
Minha raiva me enche de razão. Toda vez que me sinto
injustiçada é como se eu recebesse uma autorização para
ser cruel. Tenho vontade de ferir até que a outra pessoa
se arrependa, até que ela perceba o tamanho do erro.
Parece didático que cada pisada na bola mereça uma punição.
O castigo deve ser ruim o suficiente para que garantir que
aquilo nunca mais se repita. A ofensa justifica a minha
vontade de vingança.
Mas isso é só num segundo estágio. Primeiro, a raiva me
rouba as palavras. Sem qualquer possibilidade de articular
meus pensamentos, eu choro. Demoro a acreditar que está
mesmo acontecendo. Queria ser dessas que quebram coisas
na parede, mas a agressividade não faz parte do meu instinto.
Choro até cansar. Depois, ai de quem estiver por perto.
Sou sincera muito além do que a educação permite.
Enfio a unha em cada defeito alheio, despejo tudo o que me
incomoda de uma vez só. Distorço as situações a meu favor e ,
claro, não saio impune. Cada acusação é rebatida na mesma
medida. A discussão engrossa. Saio despedaçada e, despedaçada,
eu me fecho.
Remôo todas as cenas incessantemente e sinto que o amor
vai secando de mim. Azedo por inteiro. Chego a pensar que não
vai me fazer falta, mas no fundo sei que me engano. Porque raiva
não é rancor. Raiva passa. E quando vai embora deixa um rombo
enorme, um buraco que ajudei a cavar.
Na esperança de provocar arrependimento, eu mesma
digo coisas de que me arrependo e faço coisas das quais não me
orgulho. Confundo justiça com equilíbrio: dou o troco, magoo igual.
Confortável reclamar de impaciência e intolerância quando todos
os defeitos estão do outro lado. Às vezes, me falta espelho; às vezes
me falta gratidão...
*** Em Santa Catarina, a raiva matou mais que o tráfico no primeiro
semestre de 2009. Os crimes passionais somados aos assassinatos
por desavenças tiraram a vida de 75 pessoas. As drogas levaram 45.
(dados da Secretaria de Segurança Pública)
domingo, 19 de abril de 2009
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